domingo, 30 de janeiro de 2011

A Carta.

"Estou escrevendo porque não sei o que fazer de mim. Quer dizer: não sei o que fazer com meu espírito. O corpo informa muito."
Clarice Lispector


Lisboa, 10 de novembro de 1900.
Dona,

Primeiramente desculpe essas minhas linhas distorcidas. Nesse momento estou lhe escrevendo, mas não consigo segurar as lágrimas que me chegam. Sei que há tempos nos perdemos por entre caminhos, que nos levaram a realidades tão diferentes. Mas hoje, especialmente, imploro seu perdão.
Minha cara! Como as coisas mudaram! Lisboa cada dia anda mais florida. Sabe,  de minha alcova, sempre consigo enxergar um campo de girassóis. Pela manhã eles brilham... até mais que o sol... como os cachos dourados dos teus longos cabelos. Ah, como eu queria que você pudesse ter essa mesma visão!
A vida aqui não é fácil. Os estudos andam bem rigorosos. Mas você sabe o quanto sonhei em ser médico! E eu sinto, no fundo da minha alma, que todo esforço feito hoje, no futuro, valerão belos frutos; eu espero sinceramente poder compartilhar isso tudo com você.
Dona sinto sua falta! A cada pôr-do-sol, a cada manhã, a cada noite de luar... meus pensamentos nunca saiam de perto de ti.
Sei que sumi. Sei que nós sumimos... mas estou disposto a jogar tudo isso ao ar e voltar a Fortaleza. Por isso lhe escrevo; quando você estiver lendo essa carta eu já estarei em um navio de volta para casa ou até já estarei bem perto de ti, estou retornado ao meu lar... de onde eu nunca deveria ter saído.
Dona eu já não aguento mais. Preciso te encontrar novamente. Já ficamos separados tempo demais. Por isso te lanço uma proposta; vamos fugir de tudo isto que nos atormenta! Agora em definitivo e sem volta. Portugal será nosso novo lar! Casaremos assim que desembarcarmos! Longe de todos, de meus pais, dessa sociedade amarga que diz ter os melhores valores! Será definitivamente uma nova vida! Não se preocupe com sua nova casa... já encontrei um belo lugar para vivermos o resto do verdadeiro inicio de nossas vidas, é pequeno, mas sei que você não se importa com luxos. O que importa é o jardim, um lindo jardim que existe na casinha... cuidaremos dele juntos!
Já soube que haverá um baile de máscaras por esses dias. E essa será a oportunidade perfeita! Conto com a sorte de Alfredo nessa empreitada, seu pai não vai lhe deixar falhar...
Você vai me reconhecer minha Dona... não se preocupe. Não importa quantas máscaras possam cobrir o meu rosto, os olhos de quem se ama são sempre os mesmos; sempre reconhecíveis!


Até breve Minha Dona... minha flor.
Davi Porto.



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