domingo, 23 de agosto de 2015

27 de agosto.

Dia 27 de agosto é o dia do psicólogo. Antes de me tornar uma profissional, uma formação rigorosa foi-me ofertada, uma formação as vezes dolorida, as vezes confusa, as vezes injusta. No entanto, uma formação que me concedeu a oportunidade de ser uma profissional ética e comprometida com os ideais de uma psicologia que comtemplasse a escuta qualificada para os sujeitos que a procuram.  Durante a rotina diária do meu trabalho tento entender esta posição controversa que é a psicologia nas políticas públicas do país. Tento compreender essa jornada de trabalho desconexa que não considera a própria saúde deste profissional comprometido a escutar os diversos sofrimentos que afligem essa imensa aventura dolorida que é viver. Tento compreender estes baixos salários que muitos gestores oferecem a estes profissionais esperando em troca verdadeiros “milagres”, milagres que só a psicologia pode conceder. E tento compreender a luta. Esta é a luta que travo todos os dias para continuar comprometida com esta profissão que amo tanto, mas que é tão doída, tão desvalorizada e mal compreendida. Isso as pessoas não veem. Isso elas não podem desconfiar, pois sobre esta ciência insana repousa um suposto saber de que nós sabemos mais do que aquele que sente uma tristeza psíquica imensa, que nós sabemos e temos condições sobre-humanas de solução e de que conseguiríamos manter em nossos ombros uma sociedade plenamente reta e ética.
Porém, este texto não é só construído de uma lamentação histérica. Devo dar a outra face para a potência que é ser psicóloga. Atrás destes baixos salários, desta carga de trabalho exorbitante repousa tranquila a força de uma profissão que elege para si a compreensão do imperfeito, do que não pode ser explicado, por aquilo que foge à medicina e a ciência da exatidão. A psicologia anda na contramão. É revolucionaria. Ela não deve ter religião, cultura, partidarismo ou gêneros. Pois ela pode transitar tranquilamente entre todas as culturas, todas as religiões, procurar compreender quaisquer formas de posicionamento partidário e não favorecer gênero algum.
Eu posso enxergar um futuro brilhante para esta profissão. Uma formação que se inicia nos bancos universitários e jamais termina porque jamais nos escapa a falta, o buraco, o não-saber. No entanto, temo que esta pode ser destruída pela ganancia daqueles eu exigem uma produção, exigem horários grandiosos de trabalho, exigem milagres. Esta profissão é para quem suporta o indizível, o insuportável, aquilo que ninguém mais acredita. Ela não é mensurável, quantificável. Ela é o que é; equivoca e linda.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Birra.

Sempre acreditei ter sido uma criança que viveu uma infância deveras tranquila. Nunca ouvi relatos da minha família com afirmações do tipo; “menina tu eras danada demais!” Ou do tipo, “as coisas tinham de ser da tua vontade, era a criança mais birrenta que já conheci”. Não. Fui uma menina tranquila. Aqui ou acolá fazia um charminho, ia para um canto e fechava a cara. Fechar a cara eu fecho até hoje, então fica tudo certo.
Hoje, depois de adulta, deparo-me com birras próprias de menina mimada. De bater o pé no chão e espernear por qualquer coisa. Deparo-me chorando à toa por não conseguir algo bobo. Fico fitando as baboseiras que penso em voz alta na esperança de que “algum adulto” venha me socorrer.
E foi aí, meu amigo, que me ocorreu a pior coisa. O remorso da perca de tempo. Enquanto eu ficava parada fazendo a birra, chorando besteira, a vida fluía no seu curso. O tempo evaporava. Os processos me passavam e eu não percebia. Via-me com 5 anos no canto da sala porque negaram-me um pirulito antes do almoço.
Então parei. Parei de espernear, parei de culpar os outros pelos meus fracassos e fui eu mesma correr atrás do prejuízo. Prejuízo este que já consumia quase tudo em mim. Demorou, é verdade, mas a vida deu seu jeito. Bom mesmo é quando ela, a vida, dá-te uns sustos, presenteia-te com o real nu e cru na sua frente. E assim se fez.
Então, quando eu parei de espernear e quando o prejuízo e o remorso fizeram sua parte as coisas deslancharam. Voltei eu ao eixo, via as coisas claras como água. Pude me recompor. Então o tempo, meu fiel amante, veio-me presentear com o sossego do inesperado e com a calmaria dos sábios. Continuo eu a não saber nada da vida. A única coisa que sei é que meninas mimadas ficam de castigo na véspera do aniversário por não ter tido a paciência de esperar até o dia seguinte para abrir os presentes.